top of page

Glauber fica! Entre a anistia aos abutres e a cassação de combatentes: quem está ganhando a luta política?

  • Foto do escritor: Murphy Stay
    Murphy Stay
  • 18 de abr.
  • 6 min de leitura

Atualizado: 19 de abr.

Sérgio Lima/Poder 360
Sérgio Lima/Poder 360

Na última quarta-feira, 9 de abril, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados aprovou a abertura de um processo de cassação do mandato do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ). No entanto, essa tentativa de retaliação não é novidade: trata-se de mais um capítulo na longa trajetória de perseguições movidas pela extrema-direita contra o mandato de Glauber, que se destaca como a principal voz da minúscula bancada da esquerda socialista na Câmara.

Desde 2016, Glauber tem sido alvo de diversas investidas. Naquele ano, foi alvo de uma queixa-crime no Supremo Tribunal Federal após declarar, durante seu voto contra o impeachment de Dilma Rousseff, que Eduardo Cunha — principal articulador do processo — era um “gângster”. Em 2019, o PSL, então sob a liderança de Jair Bolsonaro, também tentou cassar seu mandato após Glauber chamar o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, de “juiz ladrão”. A acusação ocorreu durante sessão no Congresso em que Moro prestava esclarecimentos sobre as revelações da Vaza Jato, que expuseram conluios entre o ex-juiz e procuradores para condenar Lula.

Em 2022, foi a vez do então presidente da Câmara, Arthur Lira, ameaçar o mandato de Glauber. Na ocasião, o deputado socialista questionou, perante o plenário, se Lira “não tinha vergonha” de apoiar a privatização da Petrobrás, ao que Lira respondeu, em tom de ameaça, que Glauber “exagerava há muito tempo”.

Mais recentemente, em abril de 2024, o PL — atual partido de Bolsonaro — iniciou novo pedido de cassação, desta vez em resposta à defesa pública feita por Glauber à causa palestina. E foi em setembro do mesmo ano que a Comissão de Ética da Câmara admitiu a representação contra o deputado, apresentada pelo Partido Novo, que desencadeou todo o processo que agora estamos vendo. Além disso, neste mesmo mês, Glauber foi preso arbitrariamente ao tentar intermediar uma solução pacífica para uma reintegração de posse na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), campus Maracanã, ocupada por estudantes mobilizados contra mudanças nas regras de concessão de bolsas.

Há, portanto, um método — ou, no mínimo, uma recorrência — que deveria chamar a atenção de qualquer observador da política brasileira. Cabe-nos não apenas destacar essa repetição das tentativas de impedir a continuidade do trabalho de Glauber Braga, mas também denunciar o que ela revela sobre o atual estado da representação institucional da esquerda na política brasileira.

O processo atualmente em curso arrasta-se há alguns meses, mas apenas nos últimos dias passou a mobilizar figuras públicas de um progressismo mais amplo. Isso demonstra que, embora Glauber Braga já denunciasse a perseguição de que vem sendo alvo – com algumas manifestações em defesa do seu mandato –, não houve, até então, uma mobilização efetiva por parte do campo progressista capaz de impedir, ainda na Comissão de Ética, a aprovação do pedido de cassação.

O campo político governista e as demais forças de esquerda revelaram-se incapazes de garantir a continuidade de um mandato legitimamente popular. Essa incapacidade manifestou-se tanto pela aposta ineficaz num republicanismo simplório e difuso, ao tentar persuadir os parlamentares da Comissão de Ética, quanto pela incapacidade efetivamente de tumultuar e atrasar a sessão de votação.

Enquanto as atenções estavam voltadas para as novas tarifas implementadas por Donald Trump — efetivadas no mesmo dia —, os deputados aprovavam um processo de cassação sem precedentes, baseado numa acusação frágil: o episódio em que Glauber, de forma correta em nossa avaliação, expulsou das dependências da Câmara o provocador Gabriel Costerano. Este, há meses, vinha constrangendo o deputado, dificultando o seu trabalho naquele dia e, de forma covarde, atacando a reputação da sua mãe.

Evidentemente, trata-se de um procedimento burocrático, usado como pretexto para atacar a figura de Glauber, que representa um sentimento presente – ainda que de modo disperso – na base social que reelegeu Lula em 2022: a vontade de desmoralizar o canalha do MBL e de outros movimentos afins diante da opinião pública, nem que seja a base de pontapés!

O fato é que a perseguição já estava consumada, e o mandato de Glauber Braga corria, desta vez, sério risco de ser cassado – enquanto o processo contra Chiquinho Brazão, indiciado pelo assassinato de Marielle Franco, permanece parado mesmo após completar um ano desde a sua abertura. Fica evidente que os criminosos aliados de Arthur Lira estão bem protegidos.

Neste ambiente político sufocante, Glauber recorreu à tática derradeira: a greve de fome. E apesar desta tática estar historicamente associada a práticas ascéticas e quase religiosas – e não propriamente a uma estratégia de mobilização de massas –, o seu gesto teve um impacto impressionante para todos que o acompanharam, inclusive para aqueles seus mais próximos e fieis aliados. A greve conseguiu colocar a perseguição contra Glauber no centro do debate público.

Em primeiro lugar, o ato forçou os grandes meios de comunicação – que até então ignoravam completamente o caso – a darem atenção ao processo, e muitos deles denunciaram a desproporcionalidade da pena proposta. E foi apenas após o início da greve que oito ministros do governo Lula manifestaram solidariedade ao deputado, ampliando a visibilidade da perseguição que ele vem sofrendo.

Em segundo lugar, a pressão gerada pela deterioração do estado físico de Glauber levou o presidente da Câmara, Hugo Motta, a garantir que o processo de cassação só será levado ao plenário pelo menos 60 dias após a análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Com isso, aumentam significativamente as possibilidades de o processo ser enterrado de forma definitiva.

No entanto, é importante destacar que, enquanto a esquerda e o campo progressista correm o risco real de perder um dos seus mais coerentes, corajosos e qualificados porta-vozes, o bolsonarismo vem emplacando algumas vitórias e pautando o debate público, impulsionado pela passividade do governo petista, que se afunda cada vez mais num cretinismo parlamentar, o qual pouco serviu para assegurar a preservação do mandato de Glauber Braga.

Os sucessivos atos em defesa da anistia e de Jair Bolsonaro têm ganhado força, permitindo que essas pautas sejam tratadas com leviandade por parte da população e avancem perigosamente nas instâncias legislativas.

O movimento pró-anistia aos golpistas ganha novo fôlego com a abertura do processo contra Bolsonaro e alguns generais – o que, convém lembrar, não significa o fim do bolsonarismo. E o cenário torna-se ainda mais grave com a apresentação de um pedido de urgência para o projeto de anistia, protocolado por Sóstenes Cavalcante – líder do PL na Câmara –, justamente num momento em que já tramitam dez propostas com o mesmo objetivo: três no Senado e sete na Câmara, todas visando beneficiar os envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Do episódio de perseguição a Glauber Braga, extrai-se uma certeza que o próprio deputado já compreendeu a partir da sua posição política radical – razão pela qual adota uma postura combativa: a de que, mesmo que a burguesia que deu origem ao bolsonarismo acabe por descartar Jair Bolsonaro, continuará a contar com operadores políticos como Arthur Lira dentro do Estado para impedir, ao máximo, qualquer confronto real entre os interesses de classe dentro do parlamento.

Apegar-se cegamente à democracia burguesa – cada vez mais marcada por sinais de falência – é um erro grave cometido por aqueles que ignoram os ensinamentos da história e se esquecem do trágico desfecho da República de Weimar e do subsequente surgimento do Terceiro Reich. Não afirmamos que estejamos a viver uma reedição do nazismo, mas o atual rearranjo das extremas-direitas pelo mundo, num contexto de crise do capital imperialista, tem dado origem a novas ideologias igualmente destrutivas.

No Brasil, esse cenário parece favorecer a reabilitação do bolsonarismo, o qual, com vista às eleições de 2026, ao mesmo tempo que embarca efusivamente na tentativa de silenciar um dos mais destacados combatentes socialistas no parlamento, tenta enfiar goela a baixo da opinião pública brasileira a anistia para o golpismo.

Por tanto, é preciso comemorar a vitória de hoje. Glauber Braga fica! Essa palavra de ordem deve manter-se viva até que esta batalha esteja definitivamente encerrada. No entanto, deixamos uma pergunta à esquerda decadente e ao campo progressista, cujas análises se apoiam mais no otimismo da ilusão – um otimismo que vê avanços até mesmo nos recuos do governo Lula III – do que na tentativa de uma mobilização real: Quem está realmente a vencer a luta política?

Comentários


© Barravento

REVISTA BARRAVENTO

bottom of page