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L.A. (1): a respeito dos recentes protestos em Los Angeles

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    Barravento Revista
  • 6 de ago.
  • 6 min de leitura

Atualizado: 18 de ago.

Fonte: Mario Tama/AFP
Fonte: Mario Tama/AFP

A Radencommunisten é uma publicação periódica de crítica radical e intervenção política, ancorada na tradição do comunismo de conselhos. Sua perspectiva parte do reconhecimento da completa subordinação da vida da classe trabalhadora às dinâmicas do capital. Portanto, reivindica a centralidade da autoemancipação da classe trabalhadora, recusando quaisquer mediações institucionais promovidas por partidos ou sindicatos, os quais são tidos como elementos comprometidos com a manutenção da ordem burguesa. Dialogando criticamente com as condições do tempo presente, a publicação analisa episódios recentes de mobilização social, como as manifestações em Los Angeles, e aponta os limites dos movimentos espontâneos quando desprovidos de organização classista autônoma. O autor reivindica o legado da esquerda comunista holandesa-alemã e do KAPD, destacando a ação direta, a greve e a auto-organização enquanto ferramentas históricas da luta proletária. O texto abaixo foi escrito em formato de carta, buscando relatar brevemente o que estava se desenrolando na cidade estadunidense de Los Angeles durante as perseguições efetuadas pelo ICE (Immigration and Customs Enforcement). Devido a sua ampla repercussão e divulgação, a Radencommunisten explicou em nota introdutória que tal carta reflete o posicionamento e a interpretação política de um dos membros do coletivo e não da publicação como um todo. Também já foi anunciada a publicação de uma segunda carta. Acreditamos que o debate iniciado pelo texto é frutífero, enquanto umas das múltiplas compreensões e análises possíveis dos eventos em L.A. Portanto, esperamos que essa tradução também possa abrir e aprofundar o debate sobre as formas contemporâneas da luta de classes.


Nota dos editores: houve um equívoco significativo sobre a relação entre Radencommunisten e esta carta. Escrita por um dos membros do Coletivo Comunistas Conselhistas, ela não representa de modo algum a opinião nem do Radencommunisten, nem do CCC. Para as opiniões aprovadas pela publicação, ver a nossa carta de princípios bem como nossa página principal.



O movimento nas ruas


Na sexta-feira, 6 de junho, centenas de pessoas, latino y blanco igual, saíram às ruas para protestar contra a deportação violenta de milhares de imigrantes pelo ICE. Em 8 de junho, o secretário de defesa Pete Hegseth ordenou o envio da Guarda Nacional para reprimir os protestos. Em 10 de junho, 700 fuzileiros navais foram destacados para auxiliar a Guarda Nacional e o ICE. Desde então, protestos começaram em muitas cidades. Muitas organizações locais e suas respectivas filiais (PSL, 50501) organizaram manifestações para o fim de semana seguinte.

Apesar da chegada de tropas federais, os protestos continuaram acontecendo. Só na noite de 7 de junho foram detidos quase 200 manifestantes.

Entre os comunistas, os protestos receberam inúmeros apoios, sendo anunciados por quase todos os setores como um avanço na luta das massas trabalhadoras. Entre a esquerda estadunidense, os protestos já foram rotulados como a continuação dos protestos Black Lives Matter.

No contexto deste júbilo extremo, é necessário que os comunistas façam uma avaliação fria do caráter e limitação do movimento de protesto. Aqui, em vez de mergulhar nas minúcias da conveniência de certas atividades — sejam elas violentas ou pacíficas, etc. — procuramos oferecer uma análise generalizada que reconheça a tendência degenerativa persistente no interior dos próprios protestos.

 

As limitações do movimento

 

1.             O movimento ainda é dominado ideologicamente pelas classes médias. Apesar dos manifestantes terem sua origem predominantemente na classe trabalhadora, as exigências do protesto refletem os interesses da pequena burguesia. Se os trabalhadores não puderem separar-se da parte da burguesia com que partilham a sua etnia, serão forçados a adotar uma prática interclassista, levando a uma derrota definitiva do movimento. Para qualquer trabalhador, é necessário unir-se com outros trabalhadores a partir de uma base comum de classe.

2.             O movimento está limitado a um setor da classe trabalhadora. Apesar da composição variada dos protestos, eles não se espalharam para outros setores da classe trabalhadora. Enquanto os trabalhadores militantes se reuniam para os protestos, eles não tentaram trazer seus próprios setores da classe para a luta. Aqui, a participação em confrontos de rua dificulta os esforços associativos necessários para organizar um movimento independente em toda a classe. Para que a luta dos trabalhadores latinos seja bem-sucedida, ela deve se espalhar para a classe trabalhadora em geral.

3.             O movimento está atualmente limitado somente a ações de rua. O fato de o movimento assumir a forma de batalhas de rua, anunciadas por muitos da esquerda como a sua maior força, é de fato sua maior fraqueza. A greve, a maior arma da classe trabalhadora, continua monopolizada pelos sindicatos. A auto-organização de toda a classe, maior força da classe trabalhadora, permanece enjaulada. Para que a luta da classe trabalhadora seja bem-sucedida, a revolta é uma ferramenta inadequada: a classe trabalhadora deve usar sua tática mais forte, a tática da greve, e sua maior força, a capacidade de auto-organização, para atingir seus objetivos.

 

Lições para os trabalhadores e os comunistas

 

Na luta de classes, maior barreira que a classe trabalhadora tem que superar é ela própria.

Com as limitações mencionadas em mente, é evidente que, no momento, o movimento em Los Angeles não superará suas próprias limitações. No entanto, ao reconhecer o que falta atualmente ao movimento, é possível identificar quais os fatores ausentes que terão uma importância decisiva no futuro.

Neste caso, nos são dadas três lições:

1.             Para que mesmo um setor limitado da classe trabalhadora alcance seus objetivos, ele deve apresentar-se baseado explicitamente na classe. As ilusões da ideologia da classe média só podem servir para frustrar continuamente a luta independente do proletariado. Os trabalhadores, por mais isolados que sejam, devem unir-se de forma independente e consciente como trabalhadores.

2.             Para que qualquer setor da classe trabalhadora avance em sua luta, ele deve unir-se ao maior número possível de outros setores. À medida que a luta se expande de setor para setor, o poder da própria classe trabalhadora se expande exponencialmente. A expansão de qualquer luta particular para toda a classe trabalhadora é a maior tarefa na própria luta de classes.

3.             As ações de rua são a maior fraqueza das classes trabalhadoras. Em vez de limitar o seu confronto à polícia, os trabalhadores devem lutar em todas as frentes contra a burguesia, tanto dentro como fora do local de trabalho. Por um lado, devem recusar-se a continuar a trabalhar e, por outro, criar novas formas de organização para gerir os seus próprios assuntos. A melhor táctica da classe operária continua a ser a greve, a sua maior força é a capacidade de auto-organização.

 

Sobre o fracasso dos comunistas

 

Embora seja certo que o movimento comunista vá aprender estas lições, é pouco provável que o faça. Seguindo as comparações dos eventos em Los Angeles com os protestos Black Lives Matter, todas essas lições poderiam ter sido aprendidas após 2020, mas não o foram.

Lá, também, um forte movimento dos trabalhadores foi dominado pela ideologia da classe média.

Lá, também, a luta permaneceu limitada a um setor restrito da classe trabalhadora.

Lá, também, o movimento estava confinado às ruas.

Mas os comunistas, em vez de aprenderem com as suas derrotas, replicaram a sua impotência. Ainda predomina a ilusão de que o Estado nos EUA — talvez no auge de seu poder — está fadado a cair devido a mais uma revolta. Cada surto esporádico de descontentamento é anunciado pelos comunistas como o prenúncio da revolução, como uma nova forma de “violência revolucionária”. Na realidade, o desenvolvimento da violência revolucionária é um processo lento e árduo, no qual a classe trabalhadora aprende continuamente com os seus sucessos e fracassos, culminando na tomada do poder. A revolta não é a violência revolucionária: é a expressão da incapacidade da classe trabalhadora de exercê-la. O tratamento zeloso e dogmático da revolta como vox populi deve ser responsabilizado, em parte, pelo péssimo estado do movimento dos trabalhadores.

Aos trabalhadores e comunistas atualmente na linha de frente, nós enviamos os cumprimentos dos compañeros na luta. Mas, por favor, compreendam qual violência os libertará e qual violência os manterá acorrentados.

 

“A violência revolucionária é, em essência, a oposição da classe dos produtores à classe burguesa, à classe que, individual ou coletivamente, controla os meios de produção. Essa violência deve culminar com a expropriação da classe burguesa e a apropriação dos meios de produção pelos próprios produtores.

Deste modo de olhar para a violência revolucionária, o controle do local de trabalho pelos trabalhadores — como foi tentado em certos casos na Itália — é cem vezes mais violento do que qualquer enfrentamento com a tropa de choque, simplesmente porque transcende a racionalidade econômica burguesa e olha para além da sociedade como existe hoje para uma nova ordem social na qual o trabalho é organizado pelos trabalhadores para o seu próprio bem-estar. Em contraste, guerra de guerrilha, revoltas, etc. permanecem no interior dos limites da racionalidade tal como definida pelo sistema, já que não atacam de nenhuma forma direita o controle do processo de produção pelo capital” (Chameau, 1975).

 

M. S.


Chameau, Albert. “A few reflections”, Root and Branch: Rise of the Workers Movement (1978), 500. https://libcom.org/article/few-reflections-albert-chameau [“Algumas reflexões”, Raiz e ramo: Ascensão do Movimento dos Trabalhadores (1978)]

 
 
 

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